Aqui repostados na ordem inversa:

3) SOBRE O ASPECTO SOCIAL E INDIVIDUAL DO TALENTO

Uma ideia de conceito: talento não é a inclinação "natural" para alguma atividade, mas sim a dimensão social da competência, ou seja, o reconhecimento (por comparação) do desempenho acima da média de alguém em algo. Nas crianças, é algo facilmente detectado por conta do sistema escolar, que fornece um meio de comparação padronizado.


Em adultos e pessoas com maior nível de experiência em determinado campo, a base da comparação passa a ser mais complexa, em algum campos envolvendo aspectos objetivos (comparação de desempenho por métricas) ou subjetivos (na arte, por exemplo, pela crítica dos pares). De forma geral, a precocidade não é necessariamente um previsor de sucesso futuro, pois quanto mais a curva do aprendizado se torna íngreme, menos importante se torna o quão rápido foi a partida.

O que torna alguém indiscutivelmente "talentoso" (ou seja, reconhecido socialmente como tal) em determinado domínio? Acredito que, na esfera individual, não se trata somente da competência em determinadas habilidades, para mim o que separa alguém realmente talentoso são as METAHABILIDADES, ou seja, a capacidade de reflexão e autoaprendizado, ou, como coloquei em outro post, a capacidade de ALAVANCAR seu aprendizado, de propor hipóteses (thanks Augusto Maurer!), de se reinventar e ser capaz de olhar problemas em perspectivas que ultrapassam aquelas previamente aprendidas e de reflexão-na-ação. Portanto, o talento na esfera individual é resultado de uma intersecção entre inteligência, criatividade, desejo (em alguns casos, obsessão) e persistência. Foi nesse sentido que quis dizer que o TALENTO (as características individuais que produzem o reconhecimento social inequívoco da competência) sempre irá superar o ESFORÇO (irrefletido), pois existe um MITO sobre a correlação entre horas de estudo e resultados atingidos que não é verdadeiro, fruto de um erro científico (amostra viciada: se eu pegar indivíduos que já atingiram um nível de competência que lhes torna "talentosos" perante os outros é fácil atribuir falsa correlação entre horas de estudo e resultados).

No entanto, ainda que não exista uma correlação direta entre horas de estudo e resultados, tenho certeza que os talentosos estudam mais, por um motivo simples. Nenhum ser humano racional busca algo que não lhe dá prazer, portanto como alguém talentoso estuda/trabalha criativamente, essa tarefa tem sentido e relevância (origem da motivação intrínseca?), enquanto que aqueles que acreditam no mito do esforço ficam tal como Sísifo, carregando suas pedras (ou escalas?) para cima e para baixo da montanha, algo que aguentam até o limite do embrutecimento, desprovidos do encantamento, da beleza e do prazer que é realizar algo com propriedade e autosuficiência. Se você se enquadra de alguma forma nessa descrição, lembre que, depois que a pedra chegou ao topo é hora de achar outra tarefa, de buscar um novo sentido (e lembre, o perfeccionismo pode ser um defeito horrível na arte e se tornar escapismo para evitar o pensamento criativo, ser artista significa enfrentar o vazio diariamente e buscar sentido e formas na matéria bruta).
Portanto, para mim o objetivo da educação precisa ser o de trabalhar essas virtudes, aliás algo não tão distante do método socrático (certo que ele não fazia questões de múltipla escolha!). Trabalhar o TALENTO significa trabalhar um por um os componentes do desempenho excepcional. É possível? Claro, e por aí estão tantos mestres e seus discípulos para provar.

 

 

2) SOBRE A CONCEPÇÃO DE TALENTO...

 

Prezados, achei muito interessante as considerações sobre o meu post sobre talento. Aparentemente minha concepção de talento difere muito da maioria dos que comentaram. Nunca li muito sobre o assunto pela cognição musical - meu embasamento central para considerações sobre o desempenho musical - porém jamais associei talento com algo inato. Até hoje, não conheci ninguém com um dom "inato", todos com quem tive contato, inclusive inúmeras crianças-prodígio, simplesmente conseguiram ALAVANCAR seu desejo de aprender utilizando plenamente suas capacidades criativas (e, para isso, contaram com a ajuda de um mentor).

O talento também não é algo estático, quem para de desenvolvê-lo, ou seja, de continuar multiplicando sua capacidade de aprender, deixa de ser alguém talentoso e se torna um mero repetidor de si mesmo (sina da maior parte das bandas musicais e de crianças-prodígio, não?).
Pensando porque esta concepção é tão enraizada em mim, lembrei um artigo que li há 15 anos atrás (tenho boa memória, exceto para achar as chaves de casa), que sintetiza bem o porque da rejeição da ideia do talento como algo inato por grande parcela de pesquisadores:
(Link: http://www.musica.uci.edu/mrn/V8I2S01.html). Também me indicaram a definição da Wikipedia de talento, que aponta para sua origem no cristianismo, na "Parábola dos Talentos", Como professor, esta parábola vai contra tudo o que acredito, pois na parábola aquele que perde os talentos (leiam a parábola para entender o conceito de talento) que lhe foram concedidos encontra uma punição severa, da mesma forma que nosso sistema educacional estigmatiza e pune o aluno que não atingiu sua meta no tempo padronizado (aliás, eu sempre admirei alunos que dormiam nas aulas, acho que é um sinal de inteligência compreender que um assunto não é importante para si mesmo e não dar a mínima para ele, frequentemente estão certos. Aqui me refiro ao ensino superior, não ao ensino de base).

Um conceito muito interessante que tem a ver com tudo isso é a auto-eficácia, a capacidade de se acreditar apto para algo. A percepção positiva da auto-eficácia é um dos maiores previsores de sucesso futuro: alguém que acredita em suas habilidades (seus talentos?), mesmo que os projete acima de sua capacidade efetiva, possui muito mais chance de realizar seus objetivos, pois terá a tenacidade para executar a tarefa, mesmo que por defesa do ego (para provar que é inteligente, se TORNARÁ inteligente)! Portanto, nada mais importante do que afastar a ideia de inatismo e inspirar a confiança, auto-estima e despertar o DESEJO de aprender, mas não aprender de qualquer forma, aprender da forma mais eficiente possível. Eu tenho sérios problemas com a preguiça, então minha vida toda sempre gostei de dedicar meu tempo a achar a maneira mais fácil e rápida de realizar algo. Porém, acontece que, para achar a maneira mais fácil de realizar algo, geralmente é necessário ir muito além na compreensão da tarefa do que aquele que segue a orientação rígida de um caminho a ser seguido. Acho que quem busca burlar o sistema para trabalhar menos, acaba paradoxalmente trabalhando mais e aprendendo melhor, eis aqui um belo indicador de talento.
Ai

nda sobre a parábola, curiosamente na biografia da maior parte dos grandes investidores, gestores de fundos de pensão e operadores domercado financeiro, os primeiros capítulos são dedicados sobre como eles perderam seus "talentos", ou seja, como suas decisões erradas fizeram que eles quase fossem a ruína e desistissem de algo, quando estavam muito perto do sucesso. Sorte deles que ninguém nunca lhes disse que não este caminho não era para eles, mas somente para os nascidos com talento! Sorte deles que não acreditaram que seu talento era algo estático, mas algo que precisavam desenvolver! Não sabendo disso, seguiram acreditando na sua capacidade (para os calvinistas, que eram predestinados)! e atingiram todos seus objetivos...

 

1) UMA PRIMEIRA PROVOCAÇÃO SOBRE TALENTO

 

Preparando um post sobre porque o talento é muito mais importante do que o trabalho duro, em qualquer campo. Quem não trabalha em seu "talento" (e multiplica os efeitos com um mentor de altíssimo desempenho) jamais alcançará a excelência, pois a prática não leva e jamais levou à perfeição, somente ajuda na CONSISTÊNCIA, ao reduzir o tempo de reação necessário para acessar certas habilidades cognitivas altamente especializadas.

Levar a sério por exemplo a regra das 10000 horas de Ericsson significa subestimar o potencial humano e não entender que, se alguém não se tornou um expert em algum assunto após 30% desse tempo horas, não se tornará um em 10000 horas a não ser que trabalhe no seu TALENTO (tentarei uma definição do que é esse talento, mas basicamente é o parâmetro MULTIPLICADOR que diminui o tempo necessário para aprender algo).

Se o talento permite diminuir geometricamente o número de horas necessário para aprender algo, ou seja, aumentar o potencial de uma vida humana e melhor dramaticamente a qualidade de vida, porque o sistema de ensino (especialmente institucionalizado) não se concentra nesse aspecto?

Boas perguntas, que deveriam fazer parte mais ampla de um questionamento do ensino, ESPECIALMENTE o ensino superior...